Quão frustrante é vencer uma demanda judicial, que pode tramitar por longos anos, mas não conseguir satisfazer o seu direito de crédito.
Tornou-se costumeiro, quase um estigma, a presença de ações judiciais que não trazem qualquer resultado útil ao ganhador, pois é vítima das mais diversas manobras protelatórias e fraudulentas engendradas pelo devedor, sendo a mais atual delas o uso das criptomoedas à ocultação de patrimônio.
Preocupados em solucionar essa nefasta realidade, os Poderes Legislativo e Judiciário vêm buscando mecanismos e formas de superar os ardis empregados pelo devedor, mormente por meio do uso da alta tecnologia e de outros mecanismos heterodoxos.
Considerado como valor mobiliário, a criptomoeda é uma categoria de ativo financeiro com alta volatilidade e boa aceitação no mercado consumidor. Todavia, por ser descentralizada e independente dos controles governamentais, a criptomoeda tem sido um terreno fértil à ocultação de patrimônio, fraude a execução e lavagem de dinheiro.
Diferente da moeda em espécie, pode-se portar a criptomoeda em diversas modalidades de wallets ou "carteiras digitais fornecidas por corretoras e instituições especializadas, como as em pen drive, ou até mesmo em QR-Codes impressos. Por isso, considera-se extremamente difícil rastrear as operações realizadas em criptomoeda, em especial, quando os envolvidos não declaram esse ativo às autoridades competentes, mesmo se considerarmos a obrigatoriedade das corretoras registrarem a compra e venda, nos termos do artigo 6º da Instrução Normativa 1.888 da Receita Federal do Brasil.
A despeito da grande dificuldade, é possível pleitear a penhora de criptomoeda perante o Poder Judiciário, principalmente porque não consta na proteção prevista pelo artigo 833 do Código de Processo Civil. Todavia, o sucesso desta medida dependerá do empenho do advogado, na medida em que os valores não serão localizados pelos sistemas tradicionalmente ofertados pelo Poder Judiciário, como, por exemplo, o sisbajud e o infojud.
Primeiramente, precisa-se ter em mente que, normalmente, a compra de criptomoedas ocorre por meio de cartão de crédito ou transferência bancária. Isso quer dizer que a transação é rastreável. Dessarte, havendo a suspeita de que o devedor está frustrando uma execução judicial, convertendo o seu patrimônio em criptomoedas, deve-se requerer ao Poder Judiciário a expedição de ofícios às corretoras, também conhecidas como exchanges, bancos e empresas administradoras de bandeiras de cartão de crédito, para que informem a existência de transações de compra e venda de criptoativos e, caso existam, o seu bloqueio imediato.
Nos termos do artigo 139, inciso IV, do Código de Processo Civil, o Juiz tem que zelar pelo cumprimento das ordens judiciais, devendo “determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária”.
À hipótese de que se encontrem transações de criptomoedas sem a guarda dos valores pela corretora, principalmente quando o devedor se utilize de wallets offline, como pen drives e impressos, parece-nos producente pleitear ao Poder Judiciário a intimação do devedor para disponibilizar esses valores, sob pena de cometer ato atentatório à dignidade da justiça, além de incorrer nos crimes trazidos pela lei 9.613 de 1998, sem prejuízo de outros como a sonegação fiscal.
Tendo em vista a real possibilidade de se localizar e penhorar ativos em criptomoedas, o fato do Brasil carecer de regulamentação não deve servir de véu à ocultação de patrimônio pelo devedor. Muito pelo contrário. Em prol da efetivação da Justiça, Legislativo, Judiciário e Advocacia devem se unir e continuar a trabalhar no sentido de coibir vigorosamente qualquer tipo ou hipótese de falcatrua que possa furtar a satisfação do justo direito de crédito.
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